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quinta-feira, 27 de dezembro de 2012

Medida Provisória altera lei que dispõe sobre a participação dos trabalhadores nos lucros


Foi publicada na edição extra do DOU desta quarta-feira, 26, a MP 597, que dá nova redação - no tocante à tributação - ao § 5º do art. 3º da lei 10.101/00. A norma dispõe sobre a participação dos trabalhadores nos lucros ou resultados da empresa.
Dentre outras mudanças, o texto da MP dispõe que, na hipótese de pagamento de mais de uma parcela referente a um mesmo ano-calendário, o imposto deve ser recalculado, com base no total da participação nos lucros recebida pelo funcionário.
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MEDIDA PROVISÓRIA Nº 597, DE 26 DE DEZEMBRO DE 2012
Dá nova redação ao § 5º do art. 3º da Lei nº 10.101, de 19 de dezembro de 2000, e dá outras providências.
A PRESIDENTA DA REPÚBLICA, no uso da atribuição que lhe confere o art. 62 da Constituição, adota a seguinte Medida Provisória, com força de lei:
Art. 1º A Lei nº 10.101, de 19 de dezembro de 2000, passa a vigorar com as seguintes alterações:
"Art. 3º .....................................................................................
..........................................................................................................
§ 5º A participação de que trata este artigo será tributada pelo imposto sobre a renda exclusivamente na fonte, em separado dos demais rendimentos recebidos, no ano do recebimento ou crédito, com base na tabela progressiva anual constante do Anexo e não integrará a base de cálculo do imposto devido pelo beneficiário na Declaração de Ajuste Anual.
§ 6º Para efeito da apuração do imposto sobre a renda, a participação dos trabalhadores nos lucros ou resultados da empresa será integralmente tributada, com base na tabela progressiva constante do Anexo.
§ 7º Na hipótese de pagamento de mais de uma parcela referente a um mesmo ano-calendário, o imposto deve ser recalculado, com base no total da participação nos lucros recebida no ano-calendário, mediante a utilização da tabela constante do Anexo, deduzindo-se do imposto assim apurado o valor retido anteriormente.
§ 8º Os rendimentos pagos acumuladamente a título de participação dos trabalhadores nos lucros ou resultados da empresa serão tributados exclusivamente na fonte, em separado dos demais rendimentos recebidos, sujeitando-se, também de forma acumulada, ao imposto sobre a renda com base na tabela progressiva constante do Anexo.
§ 9º Considera-se pagamento acumulado, para fins do § 8º, o pagamento da participação nos lucros relativa a mais de um anocalendário.
§ 10. Na determinação da base de cálculo da participação dos trabalhadores nos lucros ou resultados, poderão ser deduzidas as importâncias pagas em dinheiro a título de pensão alimentícia em face das normas do Direito de Família, quando em cumprimento de decisão judicial, de acordo homologado judicialmente ou de separação ou divórcio consensual realizado por escritura pública, desde que correspondentes a esse rendimento, não podendo ser utilizada a mesma parcela para a determinação da base de cálculo dos demais rendimentos." (NR)
Art. 2º Esta Medida Provisória entra em vigor em 1º de janeiro de 2013.
Brasília, 26 de dezembro de 2012; 191º da Independência e 124º da República.
DILMA ROUSSEFFGuido Mantega

Exposição Pública: Justiça pune por ofensas a patrões e clientes em redes sociais



Uma ex-funcionária de um pet shop postou a seguinte mensagem em uma rede social: "Eu faltei muito, sempre com atestado, passei até detergente nos olhos e nada [de ser demitida], não limpava banho e tosa e nem calçada, e ainda bicudava aquelas cadelas malditas, erguia no chute, elas tinham muito medo de mim”. A mensagem, colocada no site de relacionamentos Orkut, fazia referência ao seu ex-empregador. O comentário indiscreto e ofensivo rendeu-lhe, recentemente, uma condenação na Justiça do Trabalho — o pagamento de R$ 4 mil de indenização por danos morais ao casal de ex-empregadores. Mas este está longe de ser o único caso de comentário abusivo de empregados nas redes sociais. Uma rápida navegada pelo Facebook, outro site de relacionamentos, é suficiente para se encontrar postagens semelhantes de funcionários e ex-funcionários.
Atualmente, não existe lei que obrigue o empregado a se conter nos comentários maldosos e ofensivos. Mas empresários podem ir à Justiça caso se sintam ofendidos ou entendam que o empregado abalou a imagem da empresa. Os danos morais são inequívocos. No caso da funcionária do pet shop, por exemplo, os ministros da 5ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho confirmaram a condenação. Eles entenderam que a conduta foi desleal e antiética, além de causar prejuízo moral com a confissão de maus tratos a animais — “sabendo-se que o número de acessos em tais redes é tão desconhecido quanto incontrolável”.
Os abusos não se restringem à relação entre empregado e patrão. Há os que resolvem ser agressivos com clientes da empresa. Recentemente, o funcionário de uma empresa de acessórios foi obrigado a fazer uma retratação pública por ofender uma consumidora no Facebook. Tudo porque ela reclamou que não recebeu a compra que fez. O funcionário não titubeou quando recebeu a reclamação. Mandou a cliente “procurar um macho”. Com a repercussão do caso, ele se retratou e informou que a consumidora foi ressarcida. “Toda empresa, física ou virtual, é responsável civilmente pelos atos de seus funcionários. A empresa, nestes casos, pode ser obrigada a arcar com a indenização por danos morais porque o funcionário é apenas um representante dela”, explica o advogado Luiz Guilherme Mendes Barreto, sócio do Mendes Barreto & Souza Leite.
Segundo ele, em casos como esse, é sempre recomendável pedir desculpas publicamente ao cliente, tentar oferecer “vantagens acima da média” e mostrar as medidas corretivas adotadas. Mesmo assim, as chances de condenação são grandes. O advogado diz que o melhor sempre é a empresa agir “preventivamente, no intuito de dificultar a ação de funcionários malfeitores”. E isso pode ser feito com medidas simples, como ter um atendente para reclamações e outro para cancelamentos, para evitar problemas, diz.
O advogado Omar Kaminski, especialista em Direito Informático, diz que há cada vez mais necessidade de se estabelecer políticas de uso de redes sociais no ambiente de trabalho. “Algumas empresas são mais permissivas. Outras bloqueiam o acesso totalmente”. Segundo ele, há também a questão da maturidade dos funcionários. “Quem quiser preservar o emprego e evitar dissabores, deve obviamente evitar esse tipo de comportamento.”
O professor da FGV Direito Rio Luiz Guilherme Migliora diz que as empresas devem ter códigos de conduta claros a respeito do que é ou não aceitável em redes sociais — desde que a conduta exigida dos empregados seja relevante para o desempenho de suas funções. “Se, por exemplo, o empregado desempenha exclusivamente trabalhos internos, como o de informática, nunca se relaciona pessoalmente com clientes e não representa o seu empregador publicamente, não faz sentido monitorar o seu comportamento em redes sociais. Por outro lado, se o empregado for um vendedor, que se relaciona com clientes e representa o empregador e seu produto perante terceiros, o monitoramento passa a fazer sentido”, compara.
De acordo com ele, o código de conduta deve ser apresentado ao empregado, preferencialmente, em reunião de treinamento. E, mesmo com a concordância do empregado, as restrições devem ser razoáveis e relevantes para as funções que ele desempenhará. O professor diz que empresas devem colocar uma cláusula em contratos ou códigos de conduta que proíbe seus empregados de lhes fazer críticas em ambientes públicos, incluindo mídias sociais. “Falar mal da empresa em público pode ser considerado má conduta e ensejar a demissão do empregado por justa causa”, diz.
Fonte Conjur

segunda-feira, 24 de dezembro de 2012

Efeitos dos Princípios no estudo do Direito do Trabalho

1 São os princípios que informam o Direito ou é o Direito que forma os princípios?  2 Os princípios são normas?  3 Os princípios originam deveres?

Provavelmente você já deve ter se deparado com essas perguntas em algum momento de sua formação acadêmica, principalmente quando estudava IED, no entanto ao analisarmos as mesmas indagações levando-se em consideração as peculiaridades do Direito do Trabalho e sua prática, o entendimento pode ser divergente, senão vejamos:


Quanto à questão 1, ainda que a norma sirva de parâmetro para a interpretação de determinados princípios, o fato é que, como o próprio nome diz, o princípio é aquilo que vem antes de tudo, é o início, é o que serve de norte para o desenvolvimento de todas as legislações e para a interpretação de dispositivos legais. Por tal motivo é que são os princípios que informam o Direito, e, em menor escala, o Direito forma os princípios. Quanto à questão 2, defendo a tese em que podemos considerar os princípios como normas, pois a Consolidação das Leis do Trabalho - CLT em seu artigo 8º consagra essa função integrativa, salientando que sua aplicação somente dar-se-á em casos onde haja omissão legal ou contratual, ou em situações onde deva prevalecer a compreensão:"As autoridades administrativas e a Justiça do Trabalho, na falta de disposições legais ou contratuais, decidirão, conforme o caso, pela jurisprudência, por analogia, por equidade e outros princípios e normas gerais de direito, principalmente do direito do trabalho, e, ainda, de acordo com os usos e costumes, o direito comparado, mas sempre de maneira que nenhum interesse de classes ou particular prevaleça sobre o interesse público". O caráter normativo contido nas regras jurídicas constantes de Constituições e leis passou a ser considerado presente também nos princípios. Assim, na idéia de "norma em sentido amplo" estariam abrangidas as noções de regras (ou "normas em sentido estrito") e de princípios. Entre os membros dessa corrente doutrinária que defende o caráter normativo dos princípios encontram-se juristas renomados como Norberto Bobbio, Paulo Bonavides, Frederico de Castro, Flárez-Valdez, Robert Alexy, Ronald Dworkin e José Joaquim Gomes Canotilho. Desse modo, de acordo com o entendimento majoritário da doutrina contemporânea, pode-se dizer que os princípios são normas. Quanto à questão 3 e,considerando-se o caráter normativo dos princípios jurídicos, pode-se afirmar que eles originam deveres. O Professor Paulo Bonavides chega a qualificá-los como normas-chaves de todo o sistema jurídico. Entretanto, cumpre ressaltar que os princípios devem sempre ser utilizados em harmonia com todo o sistema jurídico. Não devem ter prevalência absoluta sobre as regras positivadas, sob pena de ser criada total insegurança na ordem jurídica. No caso do Processo 00234-2006-013-10-00-2 RO, de relatoria da Juíza Cilene Ferreira Amaral Santos, pode-se notar que a Relatora faz referência expressa aos princípios da proteção (in dubio pro operario) e da boa-fé para decidir pela inaplicabilidade da restituição de indébito na Justiça laboral. Tendo em vista que o trabalhador recebeu verbas salariais por força de decisão judicial transitada em julgado, resta evidente a boa-fé do credor, não havendo que se falar em devolução de valores de natureza alimentar (verbas salariais). Em 03/09/2008, o TST também se manifestou nesse mesmo sentido em processo correlato (RR 1855/1991-003-08-40.4). Desse modo, entendo que os princípios originam deveres. 

sexta-feira, 21 de dezembro de 2012

TST condena empresa por submeter empregado à revista íntima


O Banco Itaú responderá de forma subsidiária caso a Transportadora Ourique Ltda. não pague a quantia de R$30 mil por danos morais causados a um auxiliar de tesouraria. O empregado era submetido diariamente à revista íntima, na qual ficava nu. A decisão é da Oitava Turma do Tribunal Superior do Trabalho (TST), que negou provimento a agravo de instrumento da instituição.

Segundo apuração feita pela juíza da Quarta Vara do Trabalho de Campinas (SP), o reclamante, a despeito de trabalhar com abertura de envelopes e malotes de dinheiro sob a vigilância de meios eletrônicos, ao final do expediente retirava o uniforme e ficava completamente despido sob as vistas de um segurança da empregadora, que atua no ramo de transporte de valores e prestava serviços ao Banco Itaú.

O reclamante relatou que a revista acontecia diariamente por duas a três vezes, sempre que precisava deixar o estabelecimento empresarial e ocorria em uma guarita, localizada em lugar de passagem dos demais empregados.

Ainda de acordo com o depoimento dado pelo auxiliar de tesouraria, na guarita tinha uma janela por meio da qual ficava exposto aos passantes, inclusive colegas do sexo feminino. O fato foi confirmado por uma testemunha que afirmou que quando havia necessidade de ir à tesouraria ao passar em frente a tal local, era possível visualizar homens sendo vistoriados nus.

Após a ratificação da sentença pelo Regional de Campinas (SP), o Itaú Unibanco S.A. recorreu ao Tribunal Superior do Trabalho sem obter sucesso. O agravo de instrumento foi analisado pelo ministro Marcio Eurico Vitral Amaro (foto), integrante da Oitava Turma, na sessão do último dia 18.

Segundo o relator dos autos, os argumentos recursais de inexistência de prova quanto ao dano moral não se sustentam frente ao quadro fático descrito pelo 15º Regional. Dessa forma, concluiu, qualquer alteração do julgado na origem exigiria o revolvimento dos fatos e provas que, todavia, não é permitido por força do teor da Súmula nº 126, desta Casa.

O Banco também não obteve êxito em afastar sua responsabilidade subsidiária pelos valores devidos ao empegado. No apelo o recorrente sustentou que a condenação deveria ser limitada às verbas de caráter nitidamente salariais, o que excluiria o valor relativo ao dano moral. 

No entanto, os ministros concordaram que ficou configurada a prática de ato ilícito pelo Banco que, de acordo com o TRT-15, absteve-se de "impedir a prática de situações vexatórias a que era submetido o Reclamante".

Processo: AIRR-18700-65.2006.5.15.0053
fonte: TST

quarta-feira, 19 de dezembro de 2012

Advogada que trabalhava em penitenciária receberá periculosidade.


Empregada celetista da Fundação Professor Doutor Manoel Pedro Pimentel – Funap, uma advogada que trabalha na Penitenciária Zwinglio Ferreira, em Presidente Venceslau (SP), teve reconhecido, pela Sexta Turma do Tribunal Superior do Trabalho, seu direito a receber adicional de periculosidade.

Em março de 2006, a autora, empregada da Funap desde 4/1/1988, ajuizou a ação com a pretensão de receber adicional de periculosidade de 30% sobre sua remuneração, com fundamento na Lei Complementar do Estado de São Paulo 315/83. O adicional foi concedido pela 82ª Vara do Trabalho de São Paulo (SP), em sentença que vem sendo questionada pela empregadora desde então.

O Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (SP) também julgou que a advogada fazia jus ao adicional de periculosidade, por prestar assistência judiciária gratuita a presos e internos. Essa circunstância, para o TRT, dá margem ao pagamento, conforme dispõe o artigo 1º da LC 315/83, prevendo a sua concessão aos funcionários públicos e servidores, pelo exercício, em caráter permanente, em estabelecimento penitenciário.

Depois disso, a Funap, por meio de recurso de revista interposto no TST, sustentou a improcedência do deferimento do adicional, alegando que a sentença dispensou a realização de perícia e que a empregada não tinha direito ao benefício pois não era funcionária pública estatutária e sim celetista. Ao examinar o caso, os ministros da Sexta Turma do TST negaram provimento ao recurso.

De acordo com o relator, ministro Augusto César Leite de Carvalho (foto), a jurisprudência do TST vem se posicionando no sentido de que o adicional de periculosidade assegurado pela LC 315/83 "beneficia não somente os servidores públicos da administração pública centralizada, mas também os empregados de fundação pública".

O fundamento, para isso, esclareceu o ministro, "é de que o termo ‘servidor público' é gênero do qual são espécies os servidores estatutários e os celetistas, não podendo a lei fazer distinção". Dessa forma, a advogada, sendo empregada celetista da Funap, teria direito ao adicional. Por outro lado, quanto à questão da falta de perícia, ponto que nem sequer mereceu conhecimento do recurso, o relator explicou que o único requisito, previsto em legislação estadual, para o pagamento do adicional de periculosidade, é a prestação de serviços em estabelecimentos penitenciários do Estado. Assim, como a lei estadual é mais benéfica que a norma celetista, é ela que rege a matéria, "pelo princípio trabalhista de aplicação da norma mais favorável", concluiu o ministro.

Fonte: TST

Processo: RR - 341200-70.2006.5.02.0082

Princípio da não discriminação justifica reversão de justa causa


Ao não conhecer recurso da Volkswagen do Brasil – Indústria e Veículos Automotores Ltda., a Quarta Turma do Tribunal Superior do Trabalho (TST) manteve decisão que, com base no princípio da não discriminação, afastou a reversão da demissão por justa causa aplicada a um encarregado de ferramentaria que confessou haver desviado R$ 32 mil em um esquema fraudulento que envolveu 105 empregados. O esquema desviava dinheiro destinado ao ressarcimento de despesas com hospedagem, alimentação a lavanderia.

A decisão mantida havia sido aplicada pelo Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região (PR) que, após verificar que outros funcionários envolvidos no mesmo esquema fraudulento não haviam sido demitidos, aplicou o principio da não descriminação como fundamento para a sua decisão.

Justa Causa

Segundo o acórdão regional, o juízo de primeiro grau reconheceu a participação do empregado no esquema de fraude com base em sua livre confissão perante a auditoria realizada e as declarações dos auditores ouvidos como testemunhas. Salienta que aquele juízo, entretanto, concluiu por afastar a penalidade aplicada de justa causa, por considerar injustificável o procedimento da Volkswagen, que puniu de maneira diferente os trabalhadores envolvidos na fraude.

Ao julgar o recurso ordinário da Volkswagen, o Regional entendeu ter ocorrido tratamento discriminatório no ato da demissão e dessa forma em nada modificou a sentença. O juízo utilizou como fundamento de sua decisão a aplicação do princípio da não discriminação, que consiste na obrigação do empregador aplicar o mesmo tipo de punição para todos os empregados que pratiquem faltas idênticas.

Em seu recurso ao TST, a Volks afirmou que diante da verificação dos atos de improbidade praticados pelo empregado agiu corretamente ao aplicar a justa causa. Observa que os ocupantes de cargo de confiança envolvidos na fraude, como o empregado autor da ação, foram demitidos enquanto que os demais sofreram outros tipos de punição. Entendia como violados os artigos 5º, caput e inciso II, da Constituição Federal e 482, "a", da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).

Na Turma o acórdão teve a relatoria do ministro Fernando Eizo Ono (foto) que ao analisar as pretendidas ofensas da empresa em seu recurso, observou que o conhecimento por violação do 482, "a" da CLT não seria possível pelo fato de que, segundo o seu entendimento, o dispositivo não enumera os requisitos circunstanciais para a aplicação da pena de justa causa, mas apenas tipifica o ato de improbidade como infração sujeita à penalidade de dispensa por justa causa. Quanto à alegada violação ao artigo 5º, caput e inciso II da Constituição, o ministro salientou a inexistência de ofensa, pois a decisão "tem como fundamento justamente o respeito e o tratamento igualitário das pessoas".

Dano Moral

O empregado, em sua reclamação trabalhista, pedia ainda a condenação da empresa por danos morais, sob o argumento de que o ato de sua demissão havia causado grande prejuízo à sua imagem. A Vara do Trabalho da Comarca de São José dos Pinhais (PR) decidiu indeferir o pedido, alegando que o ato de dispensa por justa causa decorreu do tratamento discriminatório na aplicação da penalidade, não sendo motivo suficiente para que fosse reconhecida a existência de lesão por dano moral.

O Regional, entretanto, decidiu que a reversão da justa causa conferia ao trabalhador o direito a indenização por danos morais, sob o entendimento de que o ato de improbidade imputado ao trabalhador teria atingido a sua autoestima. Inconformada, a Volkswagen recorreu ao TST alegando que a reversão da justa causa não geraria o pagamento de dano moral, por haver ficado comprovado o envolvimento do empregado no esquema de desvio de dinheiro.

Na Turma, o relator observou que a doutrina e a jurisprudência têm diferenciado a lesão ao patrimônio moral do homem e os contratempos e situações estressantes a que todos estão sujeitos no dia a dia. Diante disso, salientou em seu voto que o TST tem decidido de forma reiterada que a decisão judicial que reverte a dispensa por justa causa "não implica automaticamente o direito do ex-empregado ao recebimento de indenização por danos morais, se não comprovada a prática de abuso ou excesso por parte do empregador", que possa vir a causar constrangimento ao empregado. 

(Dirceu Arcoverde/MB)

Processo: RR-42100-21.2003.5.09.0670

Substituição eventual de trabalhador por colega não impede caracterização de vínculo empregatício


O reclamante trabalhava como encartador de jornal para uma grande editora da cidade de Contagem-MG e procurou a Justiça do Trabalho pedindo o reconhecimento da relação de emprego. Já a empresa alegou que ele prestava serviços como autônomo. Neste sentido, sustentou que ele não se submetia a controle de horário e que a relação não se revestia dos requisitos necessários à caracterização do vínculo empregatício. Segundo o representante da ré ouvido em audiência, se o trabalhador faltasse poderia ser substituído por alguém do setor. Mas os argumentos da ré não convenceram o juiz de 1º Grau. E nem a 7ª Turma do TRT-MG. Ao julgar o recurso apresentado pela editora, os julgadores tiveram a certeza, pelas provas anexadas ao processo, de que a relação era de emprego.

No caso, a relatora convocada Cristiana Maria Valadares Fenelon não teve dúvidas da presença dos fatores característicos da relação de emprego: trabalho prestado por pessoa física com pessoalidade, subordinação jurídica e de forma não eventual, mediante recebimento de salário. Isto porque foram anexados aos autos recibos de pagamentos. Subordinação jurídica também havia, já que o representante da ré reconheceu que o encartador recebia ordens do coordenador da editora. A magistrada também concluiu que a atividade exercida pelo encartador era essencial para a editora, pois ela edita e comercializa jornais. Desse modo, a chamada não eventualidade também estava presente.

A relatora não considerou relevante a alegação da ré de que o trabalhador não se submetia a controle de jornada. Isto por considerar que o empregador pode ser flexível em relação à jornada. "É perfeitamente viável empregado prestar serviços subordinados sem ter controlada a jornada, consoante se infere do artigo 62, I, da CLT", registrou no voto. Mas e o fato de o reclamante poder ser substituído por alguém do setor em caso de falta? Não afastaria o requisito da pessoalidade? A informação foi prestada pelo representante da editora na audiência, mas em nada alterou o entendimento da relatora. É que, conforme ponderou, em certas situações específicas o empregado pode, sim, ser substituído. Como exemplo, apontou casos de afastamento por doença, parto, acidente, greve, etc.

"Ora, o caráter personalíssimo da relação de emprego resulta do fato de o empregado colocar à disposição do empregador sua energia psicofísica, mas não traduz infungibilidade da prestação de serviços. Deve-se ter em vista que dentro da organização empresarial, existem funções cujo exercício pressupõe qualificações relativamente homogêneas, sendo normal a substituição de um trabalhador por outro. A prestação de serviços, conquanto intuitu personae, admite temporárias ou particulares exceções nas hipóteses de interrupção ou suspensão do contrato" , explicou a relatora no voto. Portanto, o simples fato de um empregado substituir o outro em situações de faltas não evidencia a ausência de pessoalidade.

A relatora considerou até mesmo "curiosa" a alegação da editora de que o encartador poderia deixar de comparecer ao trabalho, sem apresentar justificativa. Afinal, a atividade feita por ele é essencial para a venda dos jornais. De modo que se ele deixasse de cumprir a obrigação, tumultuaria o andamento dos serviços dentro da empresa. De qualquer modo, para a magistrada isso sequer ficou provado no processo. Diante desse contexto, a Turma decidiu confirmar a sentença que reconheceu o vínculo de emprego e condenou a editora a pagar os direitos devidos ao encartador de jornais.

( 0001908-13.2011.5.03.0030 RO )

FONTE: TRT3

Trabalhadora acusada de furtar guarda-chuva será indenizada


"Quem tem um direito pode exercê-lo livremente, desde que o faça dentro de certos limites que não excedam o conteúdo do próprio direito, ou que não revele intenções prejudiciais a outrem". A lição é do jurista João Franzen de Lima e foi lembrada pelo juiz Fernando Sollero Caiaffa, titular da 1ª Vara do Trabalho de Uberlândia, na sentença em que condenou a Sadia S.A. e uma prestadora de serviços de segurança ao pagamento de indenização por dano moral. Tudo porque uma empregada da Sadia foi acusada, sem qualquer cuidado e na frente de outras pessoas, do furto de um guarda-chuva por um vigilante que prestava serviços na empresa. No entender do julgador, um abuso capaz de gerar o direito à reparação.

A trabalhadora contou que foi abordada pelo vigilante na saída da empresa e que ele a acusou, na frente de terceiros, de ter furtado um guarda-chuva pertencente à empresa. Uma situação que ela descreveu como sendo constrangedora, vexatória e que gerou muito sofrimento. A empregadora, por sua vez, negou o fato, defendendo o direito de preservar o seu patrimônio. Já a empresa de segurança reconheceu o ocorrido, mas deu outra versão à história. De acordo com esta, a abordagem do vigilante foi respeitosa e em local adequado. Cenário bem diferente do que apurou o julgador, ao analisar as provas. É que a reclamante apresentou uma testemunha que afirmou ter presenciado a seguinte cena: o guarda acusando a empregada de "ladrona" e ela chorando e dizendo que a haviam acusado de roubar um guarda-chuva. Diante desse contexto e considerando que as reclamadas não apresentaram provas em audiência, o juiz sentenciante concluiu que a razão estava com a reclamante. Afinal, ela conseguiu comprovar sua versão dos fatos, como determina a lei. Para o julgador, houve clara violação à dignidade da pessoa e, especificamente, da trabalhadora.

No boletim de ocorrência a reclamante relatou que comprou um guarda-chuva na rua e o deixou no vestiário feminino. Após o término do serviço, pegou o objeto e saiu. Foi então que foi abordada pelo segurança e tudo aconteceu. E realmente o guarda-chuva não era o dela. Segundo a trabalhadora, ela só percebeu isso quando o vigilante o abriu. Mas o juiz sentenciante não deu muita importância para esses fatos. Se a empregada se equivocou ou se realmente foi um furto, para ele isso não tem relevância. Isto porque, de qualquer modo, houve abuso na forma de agir das reclamadas. Conforme explicou o julgador, a empresa tem o direito de abordar uma pessoa suspeita, como forma de zelar pelo seu patrimônio e tomar as providências cabíveis. O que não pode é ultrapassar certos limites. "O abuso no exercício de um direito a garantir" é o que se repudia, esclareceu na sentença. E foi nesse contexto que chamou a atenção para a lição do mestre mineiro João Franzen de Lima.

"O rigor do ato, publicamente praticado, ou seja, sem as cautelas necessárias, ao lado de uma imputação, mesmo que procedente e independente do motivo legal, traz consigo frustração, desorganização mental e até mesmo familiar, insegurança, medo e vergonha, todos passíveis de reparação", reconheceu o magistrado na sentença. Para ele, a grave acusação certamente deixou a trabalhadora com vergonha e constrangida, causando dor moral. Diante disso, entendeu que a conduta antijurídica das empresas gerou um dano moral à reclamante, decidindo condenar tanto a Sadia como a empresa prestadora de serviços de vigilância ao pagamento de indenização, arbitrada em R$5 mil reais. Houve recurso, ainda sem julgamento pelo Tribunal de Minas.

( nº 01469-2011-043-03-00-9 )

Fonte: TRT3

terça-feira, 18 de dezembro de 2012

Empresa é condenada por prática homofóbica


Um analista de Tecnologia da Informação procurou a Justiça do Trabalho pedindo o pagamento de indenização por dano moral. Tudo porque, segundo contou, sofria preconceito, constrangimento e chacotas na empresa de locação de frotas, onde trabalhava, por conta da sua opção sexual. De acordo com o trabalhador, o próprio chefe fazia críticas e o diminuía perante os colegas. O caso foi submetido à apreciação do juiz Eduardo Aurélio Pereira Ferri, titular da 8ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte, que, após analisar as provas, concluiu que a versão apresentada pelo trabalhador é verdadeira. Considerando a conduta da empresa arbitrária, abusiva e inaceitável, o magistrado decidiu reconhecer o direito à reparação por dano moral.
A ré negou que desrespeitasse o reclamante. Na defesa, fez questão de registrar que ele tinha o pior desempenho na sua área de atuação. No entanto, ao analisar o processo, o juiz sentenciante teve certeza de que o trabalhador foi vítima de constrangimentos ao longo do contrato de trabalho. Uma testemunha confirmou que os colegas se referiam ao analista com expressões grosseiras e abusivas. Bicha, veado, incompetente e burro eram algumas das palavras a ele dirigidas, de acordo com a testemunha. Para o julgador, o fato de não serem ditas na presença do reclamante não retira a gravidade da conduta. "No mundo contemporâneo, em nosso país, não há espaço para sequer comentar sobre a opção sexual de quem quer que seja", enfatizou na sentença.
O julgador constatou que o próprio superior hierárquico do analista de TI o constrangia publicamente. Também encontrou expressões desrespeitosas relacionadas ao reclamante em documentos anexados aos autos. Conforme apurou o magistrado, em uma oportunidade, o representante do réu na audiência fez questão de enviar cópias dos escritos aos demais empregados. Além disso, ele divulgou a história de um homossexual na empresa. Para o magistrado, uma forma de provocação e humilhação ao reclamante, já que a história nada tinha a ver com o objeto social da empresa. O real objetivo ficou claro: atingir o reclamante.
"Constatou-se, portanto, que a dignidade e a honra da reclamante foi violada por conduta abusiva desenvolvida em seu ambiente profissional, razão pela qual o mesmo faz jus ao recebimento de uma indenização pelos danos morais sofridos", foi como decidiu o juiz, entendendo que os requisitos da responsabilidade civil se fizeram presentes no caso do processo. O entendimento foi mantido pelo TRT de Minas, que apenas reduziu o valor da indenização para R$5 mil reais.
0001348-40.2011.5.03.0008 AIRR )

fonte: TRT3

Supervisor é condenado a indenizar empregada perseguida por estar grávida


A empregada buscou a Justiça do Trabalho, para pedir indenização por danos morais, alegando que passou a ser perseguida pelo reclamado, seu supervisor na construtora em que trabalhava, depois que ele tomou conhecimento de sua gravidez. O juiz de 1º Grau indeferiu o pedido, por entender que a reclamante encontrava-se em estado de perturbação psicológica, decorrente de uma gravidez inesperada, estando excessivamente sensível. Contudo, após analisar as provas, a 3ª Turma do TRT-MG adotou outro posicionamento.
Isso porque uma das testemunhas, cliente da construtora para a qual a empregada prestava serviços, assegurou ter presenciado uma discussão entre a reclamante e o supervisor, na qual ele disse que "grávida ela não tinha valor" e que deveria "pedir para sair". Além disso, outra testemunha afirmou que a trabalhadora era a única mulher na equipe de vendas. Consta no processo um atestado que comprova que a empregada procurou atendimento médico, apresentando sinais de distúrbio psicossomático em virtude de estresse.
Na visão do desembargador César Pereira da Silva Machado Júnior, as provas demonstram que, em razão da sua condição de mulher e grávida, a empregada foi perseguida pelo supervisor. Para o réu, a reclamante, em seu estado, não possuía valor como unidade produtiva e, por isso, ele fez de tudo para que a trabalhadora se desligasse da empresa. "Tal circunstância revela, não só a perseguição sofrida pela autora no ambiente de trabalho, mas também ato de discriminação repudiado pela Constituição da República", frisou.
Para o relator, a situação vai muito além de mero contratempo no emprego, dada a sua gravidade. Houve a prática de ato ilícito pelo reclamado, que causou desrespeito à dignidade, à honra e à integridade psíquica da reclamante, estando presentes, portanto, os requisitos previstos nos artigos 186 e 927, do Código Civil, que geram o dever de indenizar. Nesse contexto, o desembargador modificou a decisão de 1º Grau e condenou o reclamado a pagar à empregada indenização por danos morais, no valor de R$10.000,00. A Turma, por unanimidade, acompanhou o voto.
0000059-21.2011.5.03.0025 ED )

Fonte: TRT3

Anulação de multa por embargo protelatório


Multada na instância regional por ter seus embargos considerados protelatórios, publicitária consegue, no Tribunal Superior do Trabalho (TST), retirar a sanção, arbitrada em 1% sobre o valor da causa. Ao julgar o recurso, a Sexta Turma da Corte ainda deferiu à gerente, demitida pela McCann Erickson Publicidade Ltda., uma indenização por danos morais porque a agência de publicidade pagava férias, sem deixar que ela as usufruísse.
Os dois temas geraram debate na Sexta Turma. O relator, ministro Aloysio Corrêa da Veiga, votou no sentido de manter a multa e negar provimento ao recurso quanto à indenização. Mas acabou prevaleceu o entendimento dos ministros Kátia Magalhães Arruda, designada redatora do acórdão, e Augusto César de Carvalho.
Ao expor seu voto, retirando a multa, o ministro Augusto César ressaltou que, nos casos de embargos declaratórios interpostos pelo credor - autor da ação -, "o simples fato de não caber os embargos declaratórios não é motivo suficiente para aplicação de multa". Para se aplicar essa multa ao credor trabalhista, é necessário explicar porque ele iria querer postergar o processo que o levaria a ver satisfeita a sua pretensão, se ele é "naturalmente interessado na agilização da demanda", enfatizou.
Assim, por maioria de votos, a Sexta Turma excluiu a multa por embargos protelatórios aplicada pelo Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região (DF/TO) à autora e  condenou a agência de publicidade a pagar à ex-gerente uma indenização de R$ 5 mil por danos morais porque, reiteradamente, não concedeu férias à publicitária.
O caso
Com um salário de R$18.305,00 como diretora de contas, função que exercia desde a sua contratação em maio de 1997, a publicitária foi demitida sem justa causa em abril de 2010, sob a alegação de fechamento da filial da agência em Brasília. Na reclamação, ela pleiteou, entre outros itens, a reintegração ou indenização devido à estabilidade que teria até janeiro de 2013, pois era dirigente sindical desde 2009.
Pediu também diferenças pelo acúmulo de função de gerente desde janeiro de 2005, cujo salário era de R$ 30 mil, e indenização por danos morais por não ter usufruído férias durante todo o contrato de trabalho, apesar de ter recebido o pagamento delas. Na primeira instância, foram deferidos seus pedidos de indenização por dano moral, no valor de R$ 5 mil, e de diferenças de acúmulo de função.
A estabilidade sindical, porém, foi indeferida, porque, aplicando a Súmula 369 do TST, a 17ª Vara do Trabalho de Brasília entendeu que, com a extinção da atividade empresarial da agência na base territorial do Sindicato dos Publicitários de Brasília, não haveria razão para subsistir a estabilidade da diretora/gerente. A McCann Erickson e a publicitária recorreram da sentença.
O Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região (DF/TO) excluiu a indenização por danos morais, sob o fundamento de que o prejuízo pelas férias não usufruídas já teria sido compensado com o pagamento em dobro das férias. O pagamento em dobro é punição definida no artigo 137 da CLT, o qual estabelece que, sempre que as férias forem concedidas após o prazo, o empregador pagará em dobro a respectiva remuneração.
Contra essa decisão, a autora interpôs embargos declaratórios, buscando efeito modificativo para reverter o resultado do recurso ordinário. Esses embargos, porém, foram considerados protelatórios pelo TRT e ela acabou sendo multada, conforme parágrafo único do artigo 538 do Código de Processo Civil. A publicitária, então, recorreu ao TST, discutindo a retirada da indenização por danos morais, a multa e a estabilidade provisória de dirigente sindical.
Caso emblemático
A Sexta Turma, ao conceder a indenização por danos morais pela não concessão de férias, restabeleceu sentença da 17ª Vara de Brasília. Para o ministro Aloysio, relator, que mantinha o entendimento do TRT, o pagamento em dobro das férias servia para compensar a trabalhadora pelos prejuízos sofridos. Para a ministra Kátia, porém, a dobra de férias supre apenas uma situação específica, de um ou dois períodos de férias.
"Aqui é uma situação reiterada, ano a ano, de 2004 a 2009", destacou a ministra, ao propor a indenização por danos morais. Houve, segundo ela, um prejuízo moral, porque, além de não gozar férias e ser sobrecarregada com acúmulo de funções, a gerente não pôde descansar, tirar férias com seus filhos, sendo privada dos momentos de lazer e do convívio familiar, com implicações à saúde e segurança.
Segundo o ministro Augusto César, este é um "caso emblemático", por haver uma lesão de tal monta quanto ao direito de férias e consequentemente ao direito à convivência social, familiar, direito fundamental ao lazer, que "isso não poderia estar incluído na reparação que diz respeito à remuneração das férias, sejam simples ou dobradas". Para ele, o pagamento das férias em dobro "não contaminaria o direito à indenização por danos morais".
(Lourdes Tavares/MB)

segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

Estagiária tem vínculo reconhecido


A Oitava Turma do Tribunal Superior do Trabalho (TST) confirmou o vínculo empregatício entre uma estagiária e duas empresas do ramo farmacêutico. De acordo com os ministros, as recorrentes não comprovaram as alegações feitas no agravo de instrumento de que a decisão regional teria violado dispositivos legais ou divergido de outros julgados, conforme determina o artigo 896, alíneas ‘a' e ‘c', da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).
Estágio X vínculo de emprego
A autora da ação trabalhista afirmou na inicial que foi contratada "na condição disfarçada" de estagiária e prestou serviços como vendedora de produtos energéticos para a Germed Farmaceutica Ltda e EMS S/A. Explicou que estava sujeita às normas empresariais com total subordinação e dependência jurídica.
Ao apreciar o pedido de reconhecimento de vínculo empregatício, o juiz da 4ª Vara do Trabalho de Campo Grande (MS) acolheu as alegações da autora e condenou as empresas integrantes do mesmo grupo econômico a responderem pelas verbas rescisórias. Para o magistrado, as reclamadas falharam ao não acompanhar o estágio elaborando o devido planejamento e execução do programa pedagógico de profissionalização, uma vez que "o estágio escolar tem por escopo a complementação do ensino aprendizagem e é preciso correlação entre a teoria estudantil e a prática".
O Tribunal Regional do Trabalho da 24ª Região (MS) rejeitou os argumentos recursais das empregadoras e confirmou sentença. Segundo a decisão, as empresas sequer tinham sede na cidade, e a contratada estava vinculada a um supervisor que somente comparecia a Campo Grande uma vez por mês e, por vezes, a cada dois meses. Para os magistrados, esse aspecto ressalta o descumprimento das normas quanto à obrigação da parte concedente do estágio de manter um empregado do seu quadro com formação ou experiência profissional, para orientação e supervisão do estudante contratado.    
O agravo chegou a esta Corte Superior e foi analisado pela desembargadora convocada Maria Laura de Faria que, atualmente, compõe a 8ª Turma.
Ao negar provimento ao recurso, a relatora dos autos ressaltou a inaptidão do apelo por não atender as exigências do artigo 896, alíneas a' e ‘c', CLT. Com esse posicionamento, o reconhecimento do vínculo ficou mantido.
A decisão foi unânime.
Fonte: TST

OS CRIMES CONTRA O TRABALHADOR NO EMPREGO E A INEXISTÊNCIA DE PUNIBILIDADE - Manoel Hermes De Lima


Publicado em DEZ de 2012.
Manoel Hermes De Lima Especialização em Mediação e Arbitragem (Turim, Itália)
Especialização em Economia do Trabalho e Sindicalismo - Unicamp (Campinas, São Paulo)
Especialização em Direitos Humanos - Universidade Pablo de Olavide (Sevilha, Espanha)
Mestrado em Direito Público - UFPA (Pernambuco)
Doutorando pela Universidade Gama Filho (Rio de Janeiro)
Professor de Metodologia do Ensino Científico - Amatra 19 (Alagoas)
Juiz aposentado do TRT 19ª Região (Alagoas)
Advogado Tributarista.

RESUMO: A questão dos crimes contra a organização do trabalho tem promovido grandes discussões no meio jurídico, com afirmações diversas no que diz respeito a qual Justiça compete punir o autor do delito. Em vista desse impasse, vem a ideia de discorrer sobre o assunto e torná-lo de conhecimento público, mediante provocações aos leitores, a fim de inspirar reflexões. O trabalho prende-se à inserção dos crimes contra a organização do trabalho que está inserido na norma constitucional outras controvérsias decorrentes da relação de trabalhona forma da lei, que conduz o intérprete ao entendimento de ser a Justiça do Trabalho competente para processar e julgar a ação criminal, decorrente da relação de trabalho, na forma da lei (norma constitucional).
PALAVRAS-CHAVE: Competência; liberdades; norma de eficácia plena.
SUMÁRIO: Introdução ; 1 Liberdades na Filosofia, na Sociologia do Direito, na Economia e no Direito ; 2 A igualdade e as liberdades simbólicas no Brasil ; 3 Norma de eficácia plena, de eficácia contida e de eficácia limitada ; 4 Normas de eficácia contida ; 5 Normas de eficácia limitada ; 6 A Interpretação da norma “outras controvérsias decorrentes da relação de trabalho” ; 7 A hermenêutica jurídica constitucional frente aos privilégios ; 8 O trabalho degradante como restrição das liberdades fundamentais ; Conclusão ; Referências .
INTRODUÇÃO
Nos dias atuais, o intérprete do direito penal não mais se prende à antiga classificação dos delitos com base no antigo Direito romano, que o dividia em delicta publicae delicta priviata. Todavia, o intérprete não despreza a noção dos crimes que visam à destruição da sociedade ou dos que a representam, bem como os que atingem o cidadão em sua vida, liberdade, honra, imagem e bens. Por fim, os crimes que infringem a lei, sobretudo na prática de delitos classificados contra bens naturais, como a vida, a integridade pessoal e a liberdade individual.
Ao se reportar à prática de crime, vem a noção de que é perpetrado contra a pessoa física ou seus bens morais, aos quais cabe a tutela do Estado, tanto de forma preventiva como repressiva. Preservar a vida do indivíduo, a intangibilidade corpórea, a honra e a liberdade da pessoa são interesses próprios e exclusivos do Estado, representado pelo Poder Executivo (modo preventivo) e pelo Poder Judiciário (forma repressiva).
Na referência ao Judiciário, não importa se é comum, federal ou trabalhista. Tudo depende em que situação do direito se encontra a vítima e se o crime é cometido fora ou dentro do recinto de trabalho. Se a ocorrência se dá contra o trabalhador no emprego, o entendimento é de que se trata de competência da Justiça do Trabalho (exceto os homicídios, as lesões corporais e os crimes de interesse da União), mesmo não sendo órgão de jurisdição criminal. Essa competência surge por conta e força do disposto no art. 114, inciso IX, da Constituição Federal , que diz respeito à norma jurídica tratativa de outras controvérsias decorrentes da relação de trabalho (ou de emprego) na forma da lei. Nos crimes contra a organização do trabalho, um de seus dispositivos guarda sintonia com a legislação trabalhista e com a Constituição Federal (art. 7º) . Trata-se do art. 203, que no Código Penal possui linguagem semântica à disposição contida nos princípios fundamentais, art. 1º, incisos III e IV, da Carta Magna , que positiva no ordenamento jurídico pátrio a dignidade humana e os valores sociais do trabalho e a livre iniciativa. O art. 203 do Código Penal , ao descrever o delito patronal com a expressão frustrar mediante fraude ou violência, direito assegurado pela legislação do trabalho, está a indicar haver, no cometimento, a existência de ofensa à dignidade humana do trabalhador e o desrespeito aos valores sociais do trabalho e à livre iniciativa. O dispositivo penal, na oração frustrar mediante fraude, explicita o exercício pelo empregador da prática de crime contra o Estado, mas, antes de tudo, contra a pessoa humana do empregado, sem dúvida, o alvo principal. Quando a lei usa o conteúdo ou violência a direito assegurado pela legislação do trabalho, significa ter o empregador usado da força, da ameaça e da coação irresistível contra o trabalhador. Tanto na primeira quanto na segunda situação o delito está configurado. Em ambos os casos, o obreiro é o sujeito passivo da ação delituosa de alguns patrões. Estes, ao contratarem trabalhador, de antemão já se acercam do dolo, porquanto têm registrado em sua consciência a antijuridicidade do resultado: mediante fraude ou à força para obter vantagens ilícitas com o trabalho do operário. Como alguns empregadores, nessas circunstâncias, visam a uma coisa ou outra, tem-se como praticantes de dolo alternativo, porque de um modo ou de outro seu objetivo é o mesmo - causar dano à pessoa do empregado.
Nas formas descritas anteriormente, o crime de autoria do empregador contra o empregado existe, porém é preciso saber se a punibilidade do patrão se efetiva ou se, como sói acontecer no Brasil, para ele a lei é só formal, porquematerialmente, na verdade, não se realiza, em vista da sua condição econômica, partícipe da sociedade capitalista, membro da elite, título e condição que deixam o autor do crime imune de qualquer penalidade e à vontade para continuar a praticar arbitrariedade e atrocidades contra o obreiro, indivíduo supostamente pertencente ao escalão inferior da sociedade, sem prestígio político ou poder econômico.
Aqui, nessa terra boa e generosa, como antes descrita por Pero Vaz de Caminha, a igualdade existe só na lei (igualdade e liberdade simbólicas). Os diferentes continuam sempre diferentes, em todas as situações, e, assim, é possível dizer que a igualdade e as liberdades brasileiras não passam de formais. Se o escrivão da esquadra de Cabral possuísse, na época do descobrimento, uma bola de cristal, certamente, suprimiria de sua carta ao Rei de Portugal, D. Manuel, a palavra boa e, quem sabe, também, generosa.
1 - LIBERDADES NA FILOSOFIA, NA SOCIOLOGIA DO DIREITO, NA ECONOMIA E NO DIREITO
As liberdades podem ser estudadas em vários aspectos, como na Filosofia, na Sociologia do Direito, na Economia e no Direito propriamente dito.
Do ponto de vista da Filosofia, liberdade tem três significados fundamentais, correspondentes a três concepções:
1 - Como autodeterminação ou autocausalidade, segundo a qual liberdade é a ausência de condições de limites;
2 - Liberdade como necessidade, que se baseia no mesmo conceito da precedente, a autodeterminação, mas mediante a atribuição da totalidade a que o homem pertence (mundo, substância, Estado);
3 - Liberdade como possibilidade ou escolha, segundo a qual a liberdade é limitada e condicionada, isto é, finita.1
1. ABBAGNANO, Nicola. Dicionário de filosofia. São Paulo: Martins Fontes, 1999. p. 612.
Sob a óptica da Sociologia do Direito, tem o significado de fazer tudo aquilo que não prejudica a outrem dentro dos limites previstos em lei. Liberdade pode ser tomada em quatro sentidos:
1 - Em relação à matéria jurídica, é o estado de independência do indivíduo ou de um grupo em relação ao seu ambiente, à sociedade e ao governo dessa sociedade;
2 - Em relação ao antigo Direito francês, significa imunidade, privilégio;
3 - e 4. Em relação ao fixado pelo texto da Declaração dos Direitos do Homem, de 1789, é o direito de fazer tudo aquilo que não prejudica a outrem dentro dos limites previstos por lei (liberdade civil), mesmo em detrimento do governo (liberdades políticas e liberdades públicas).2
2. ARNAUD, André-Jean. Dicionário enciclopédico de teoria e de sociologia do direito. Trad. Vicente de Paulo Barreto. Rio de Janeiro: Renovar, 1999. p. 466-468.
Ditas liberdades se entrelaçam com o Direito, em vista de a liberdade civil, as liberdades políticas e as liberdades públicas simbolizarem a busca pelo direito. O indivíduo, por meio delas, luta pela garantia e pela concretização de seus direitos subjetivos, que, por outro lado, tem como fim perseguido a paz, daí a vida do direito é a luta: luta dos povos, dos governos, das classes sociais, dos indivíduos 3
3. IHERING, Rodolf Von. A luta pelo direito. Trad. Pietro Nassetti. 2. ed. São Paulo: Martin Claret, 2008. p. 27.
. O direito, antes de ser direito concreto, é, de outra forma, direito positivo, contido na lei material e abstrata e na Constituição Federal. Como diz Ferdinand Lassalle: ambas têm, evidentemente, uma essência genérica comum 4
4. LASSALLE, Ferdinand. A essência da constituição. 6. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2001. p. 7.
, porquanto são proposições jurídicas, também conhecidas como regras jurídicas, dotadas de normatividade estatal, estabelecedoras de comandos àqueles a quem se dirigem para se comportarem de acordo com o direito. O direito de ir e vir, o direito ao trabalho livre de pressão e livre na escolha e contratação têm significado de liberdade, em vista de a Constituição dos Direitos Humanos representar um passo firme dirigido à democracia como condição para reconhecimento da liberdade dos cidadãos de cada país.
Ao juiz cabe, por meio da sentença prolatada, reconhecer na lei a liberdade das pessoas, todavia, isso não acontece de forma solta, mas presa a uma fundamentação ou a uma interpretação da Constituição Federal, posto que a interpretação constitucional tem, em princípio, um duplo objeto possível: procura com ela fixar o sentido de uma norma constitucional; ou interessa fixar o sentido de uma norma, ou de um comportamento em relação à Constituição5
5. VIGO, Luis Rodolfo. Interpretación constitucional. 2. ed. Buenos Aires: Lexis Nexis, 2004. p. 83.
. Nesse raciocínio, vê-se a necessidade de atribuir um significado jurídico ao texto constitucional, de modo a reconhecer qual é a conduta à qual está a obrigar, a proibir ou permitir, porque a depender do entendimento e da conclusão do intérprete é que se pode afirmar ou negar se o comportamento de A tolhe a liberdade de B. No todo desse processo, o juiz encontra, mediante o uso de argumentos que começam com a implantação de um problema (se a lei em questão é ou não constitucional) e terminam com uma resposta (basicamente que a lei é constitucional) 6
6. ATIENZA, Manuel. El sentido del derecho. Barcelona: Ariel, 2001. p. 257.
, em vista de ser a questão tratada referente à liberdade das pessoas.
Por fim, a liberdade pode ser tratada sob o ponto de vista econômico, que está ligado diretamente ao fatortrabalho/emprego. No Direito brasileiro, os diferentes são tratados como diferentes sempre. O trabalhador brasileiro, por conta de sua condição econômica débil, vê-se transformado, por alguns empregadores, em neoescravo, a cujo tratamento conceitua-se como liberdade indiferença, por ser indiferente à verdade, à moralidade, à justiça e ao bem social. O contraste entre liberdade e indiferença reside no egoísmo individual e nas desigualdades econômicas, espectros que perduram no mundo enquanto o poder e o crédito ficarem concentrados nas mãos de poucos e a grande maioria dos cidadãos (trabalhadores) ficarem reduzidos ao estado de assalariados ou, até, neoescravos, sem segurança para o futuro7
7. SHEEN, Fulton J. O problema da liberdade. 5. ed. Trad. Augusto de Melo Saraiva. Rio de Janeiro: Agir, 1956. p. 19.
. O homem é livre quando faz o que lhe convém fazer, fala algo que quer falar, quando escolhe o trabalho, a forma de trabalhar e contratar a quem melhor lhe aprouver. A liberdade tem propósitos e metas. Busca-se ser livre para atingir um objetivo. O trabalhador quer ser livre ao contratar com o patrão, mediante acerto de horário e de remuneração, que lhe possibilite com o ganho a aquisição de bens, a fim de ser feliz junto aos seus. A liberdade não é um mérito constitucional, nem um direito natural, nem um direito humano, nem tampouco um direito social; é, acima de tudo, um direito espiritual 8
8. Idem, p. 33.
. Em face dessa situação, a democracia encontra dificuldades em estabelecer limites nas manifestações das pessoas, na forma de agir, de pensar, de fazer por esquecer a finalidade do ser humano. Na democracia, liberdade significa liberdade para si mesmo e escravidão para outros, em que os fortes têm liberdade de afirmar os seus direitos ou que os fracos têm liberdade de ser indefesos9
9. Idem, p. 33-34.
.
Há alguns empregadores que, na ânsia de obter riqueza, desprezam a dignidade humana e a liberdade do trabalhador, submetendo-o a trabalho extenuante e transformando-o em neoescravo, a cujo tratamento a Igreja Católica lança sua censura:
O mais importante de tudo é resguardar os pobres trabalhadores da crueldade dos vorazes especuladores que empregam os seres humanos como meros instrumentos de fazer dinheiro. Não é justo nem humano esmagar assim os trabalhadores sob o peso de um trabalho excessivo, a ponto de embrutecer-lhes o espírito e consumir-lhes o corpo.10
10. Encíclicas e documento sociais - Leão XIII - Rerum novarum - A octogesima adveniens. São Paulo: LTr, 1991. p. 36.
O obreiro submetido a trabalho extenuante em pouco tempo torna-se frágil e debilitado, por conta de alimentar-se mal e, assim, rápido, perde sua saúde e força física. O indivíduo em si quer sua liberdade, sentir-se livre para relacionar-se com outros indivíduos, com o mundo e crescer junto com a sociedade dinâmica, por isso, o ser humano não tem medo da liberdade, daí seguir ao encontro da igualdade e das liberdades públicas, para que não se configurem as chamadas liberdades simbólicas, práxis no Brasil.
2 - A IGUALDADE E AS LIBERDADES SIMBÓLICAS NO BRASIL
O trabalhador brasileiro, quando submetido ao trabalho degradante ou ao trabalho em condições degradantes, por exemplo, não se vê em condições de enfrentar o empregador na Justiça para vê-lo punido pelo crime previsto na legislação trabalhista, cometido contra o primeiro e contra a ordem social (leis trabalhistas) dentro do contexto de crime contra a organização do trabalho ( art. 203 do Código Penal ). O poder econômico e político do empregador, por vezes, pesam diante da Justiça, fatores que lhe privilegiam com a impunidade. A isso a doutrina atual denomina deconstitucionalização simbólica 11
11. NEVES, Marcelo. A constitucionalização simbólica. São Paulo: Martins Fontes, 2007.
.
A efetividade das leis redundaria em uma política democrática e igual para todos, entretanto, a política simbólica privilegia grupos minoritários organizados para obtenção de benefícios concretos e satisfação de interesses específicos12
12. Idem, p. 24.
. Se a lei penal não produz eficácia material contra o representante do capitalismo por ostentar essa condição, o operário continuará vítima indefesa por conta da omissão de quem cabe tomar providências concretas contra o infrator.
O art. 5º da Constituição Federal de 1988 , no seu conteúdo formal, prega a igualdade de todos, porém propalada tão só no perfil descritivo-formal, e não mais que isso, porque, no caso anteriormente citado (crime do empregador contra o empregado), não se verifica a materialização do dispositivo constitucional em algumas situações e contra alguns empregadores autores do crime, em vista de o órgão Judiciário omitir-se de aplicar a regra prescritiva correspondente. A concretização pelo órgão Judiciário deixa a desejar tal procedimento profligador da confiança do cidadão-operário, que de forma contumaz se torna vítima do ato-fato-ilícito de alguns patrões. O Judiciário trabalhista, na sua omissão, usa comoálibi a redação do art. 114, inciso IX, da Constituição (interpretação equivocada), pois assevera lhe faltar competência para julgar criminalmente o empregador (quando é o inverso). É de se ver que o artigo constitucional ora citado fala em outras controvérsias decorrentes da relação de trabalho (ou de emprego) na forma da lei. Que lei? A ordinária ou a complementar? Nenhuma das duas leis está prevista para ser editada e não será. Na Carta Magna, o art. 114 refere-se aoutras controvérsias decorrentes da relação de trabalho (ou de emprego) na forma da lei. No caso em discussão, prevalece a norma constitucional ora citada. A expressão na forma da lei entende-se, em princípio, como uma lei a ser editada, mas na redação da norma mencionada verifica-se erro terminológico e técnico-jurídico do legislador. Se a expressão fosse conforme a lei ou de acordo com a lei, o sentido é que a mesma já existia, mas, ainda assim, a aludida lei seria inócua, porque só a Constituição Federal atribui competência ao Poder Judiciário. A legitimação do Judiciário para decidir sobre uma questão de ordem constitucional não precisa que o conteúdo linguístico esteja expresso na Lei Maior de forma detalhada. Mesmo que contido de forma implícita, como ocorre no seu art. 114, inciso IX , impede ao juiz desobrigar-se de decidir mediante o uso do inexistente manto de incompetência absoluta, em vista de, nessa ação omissiva, ceifar a liberdade do trabalhador, por conta de impedir-lhe o acesso à Justiça pelo fato de não efetivar a aplicação de punibilidade ao autor do crime.
Existe uma desarmonia constitucional entre a redação da parte final do art. 114, inciso IX (na forma da lei) e o art. 109, VI, da Constituição Federal . O último dispositivo diz: Aos juízes federais compete processar e julgar: os crimes contra a organização do trabalho e, nos casos determinados por lei, contra o sistema financeiro e a ordem econômica financeira(inciso VI). O art. 114 estabelece: Compete à Justiça do Trabalho processar e julgar: outras controvérsias decorrentes da relação de trabalho (inciso IX), incluídos, aí, os crimes cometidos por alguns empregadores contra seu empregado, crime tipificado no art. 203 do Código Penal .
Nota-se que a competência atribuída pelo legislador constituinte aos juízes federais não se refere a causas trabalhistas e a outras controvérsias decorrentes da relação de trabalho ou de emprego, mas apenas quando o crime contra a organização do trabalho afetar diretamente a União. O trabalho degradante ou em situação degradante, o trabalho em condições perigosas e insalubres, o trabalho em condição análoga à de escravo, o trabalho contínuo em horas extras e o não cumprimento das leis trabalhistas (lesão a interesses individuais e coletivos dos trabalhadores) são todos crimes contra a organização do trabalho e, no entanto, não estão na competência dos juízes federais, porque afetam diretamente o trabalhador. Há de salientar, também, que, se o empregador cometer crime de lesões corporais ou homicídio contra o empregado, a competência é da Justiça comum. Há, efetivamente, na edição da emenda à Constituição nº 45, erro de tecnicismo jurídico e terminológico do legislador constituinte na elaboração da norma, pois a competência para processar e julgar os crimes contra a organização do trabalho (exceto nos casos que a afetam a União e a Justiça comum) são, por uma questão ôntica, deôntica e teleológica, da Justiça do Trabalho.
Nos crimes contra a organização do trabalho não se vê a preocupação da Procuradoria Regional da República em promover ação contra o autor do crime pela exploração de mão de obra humana. Constata-se, sim, que a União, por meio da Procuradoria Federal cobra do referido empregador, na Justiça Federal, as contribuições previdenciárias que deixa de recolher em razão do pagamento de salário não condizente com a realidade. Recolhidas pelo empregador as contribuições previdenciárias correspondentes ao período do trabalho neoescravo, tudo está resolvido e pronto, e o crime contra a pessoa do trabalhador não se fala.
Igualmente, a Procuradoria da Receita Federal cobra na Justiça Federal o Imposto de Renda decorrente do lucro obtido pelo empregador por conta do salário pago em valor menor ao empregado e não declarado pela empresa o lucro alcançado com o calote ao obreiro, sobretudo pelo trabalho prestado além do horário normal e em situações insalubres e/ou perigosas. As contribuições previdenciárias e o Imposto de Renda são cobrados pela instituição credora ao empregador nas situações descritas anteriormente, em vista de ser considerado pela União o responsável por transferênciados mencionados tributos. Concernente à contribuição previdenciária, responde perante a União em duas situações: a) se pagar salário baixo ao empregado e não descontar sua parte para Previdência Social; e b) se descontar, não efetivar o recolhimento (crime de apropriação indébita). Nesses pontos, resta resumido o interesse da União.
Os juízes trabalhistas estão conscientes de possuir a mencionada competência, mas temem julgar criminalmente alguns empregadores que se fazem desavisados da obrigação de cumprirem as leis sociais trabalhistas. Os juízes, por presumirem ter sua decisão anulada ou reformada pelos Tribunais Superiores em grau de recurso, preferem dizer-seincompetentes em razão da matéria. O procedimento dos juízes soaria melhor nos meios sociais se aplicassem a lei penal aos infratores, mediante fundamentação na norma do art. 114, inciso IX, da Constituição Federal . As decisões surtiriam, na camada da sociedade, um efeito compacto e satisfatório, e isso levaria os Tribunais Judiciais Superiores e o Poder Legislativo a concordar com o posicionamento dos juízes, cujos poderes ver-se-iam obrigados a mudar o modo de ver a situação, e promover a devida retificação na Constituição Federal.
A Associação Nacional dos Magistrados Trabalhistas (Anamatra), a respeito dessa competência, já apresentou seu posicionamento a favor em duas ocasiões: a primeira, quando era presidente o Juiz Hugo Mello, mediante proposta da entidade maior dos juízes trabalhistas (Anamatra) ao Tribunal Superior do Trabalho, que na época contou com o apoio do presidente do Tribunal Superior do Trabalho, Ministro Francisco Fausto, que defende o deslocamento da competência dos crimes contra a organização do trabalho da Justiça Federal para Justiça do Trabalho. O ministro presidente do TST poderia ser mais prático e objetivo, pois, em lugar de defender o deslocamento da competência de uma justiça para outra, o ideal seria sustentar, com base na regra constitucional do art. 114, inciso IX , a total e plena competência da Justiça do Trabalhopara julgar os crimes contra a organização do trabalho (exceto os casos de interesse da União e os crimes de homicídio e lesões corporais - competência da Justiça comum) por estarem inseridos no contexto de outras controvérsias decorrentes da relação de trabalho (ou de emprego).
Em uma segunda ocasião, o também presidente da Anamatra, Juiz Grijalbo Fernandes Coutinho, faz um relato sobre otrabalho escravo, cita as origens desse tipo de submissão do ser humano, que perdura até os dias atuais (século XXI), e assinala que a Anamatra, antes mesmo de ser levantada pelos profissionais do mundo jurídico a bandeira contra o trabalhoescravo, já propugnava pelo deslocamento da competência da Justiça Federal para a Justiça do Trabalho. O Juiz Grijalbo também comete equívoco com relação à questão da competência. Esse deslocamento não era e não é necessário, simplesmente porque a competência trabalhista sobre a matéria está fincada nos termos da norma (lei constitucional) art. 114, inciso IX, da Carta Magna , que se refere unicamente à lei (norma constitucional), norma de eficácia plena, sem fazer referência à norma programática, à norma de eficácia contida ou à norma de eficácia limitada.
Nenhuma lei ordinária ou complementar está autorizada a conceder competência material ao Judiciário. Só e unicamente a Constituição Federal. Não há vigência de lei reguladora da competência em razão da matéria concedida ao Judiciário antes de 1988 pelo legislador ordinário e, se existisse, não estaria recepcionada pela Lei Maior e, por outro lado, não sofreriarepristinação, porque, simplesmente, estaria revogada. O termo outras controvérsias decorrentes da relação de trabalho(ou de emprego) na forma da lei requer do intérprete perquirir o que quer dizer a referida expressão e que sentido possui no sistema constitucional brasileiro trabalhista. Que tipo de norma quer o legislador explicitar? A resposta será encontrada na ratio constitucional, daí a necessidade de se fazer uma análise sobre a eficácia das normas.
Para melhor elucidar a competência da Justiça do Trabalho sobre o objeto trazido à discussão, passa a discorrer sobre as normas de eficácia plena, de eficácia contida e de eficácia limitada, bem como reforçar a tese de ser a norma outras controvérsias decorrentes da relação de trabalho (ou de emprego), efetivamente norma de eficácia plena.
3 - NORMAS DE EFICÁCIA PLENA, DE EFICÁCIA CONTIDA E DE EFICÁCIA LIMITADA
O estudo de eficácia das normas demanda uma discussão acadêmica merecedora de realce, que se inicia com Helena Diniz, ao se reportar ao Direito italiano, com menção ao entendimento de Caetano Azzariti, que discrimina as normas constitucionais em: a) preceptivas; e b) diretivas. As primeiras, são de caráter obrigatório e impositivo; as segundas, não são obrigatórias e podem ser violadas pela lei ordinária, sem que ocorra inconstitucionalidade, porquanto elas contêm, apenas, uma diretriz ao legislador futuro e, por isso, não têm qualquer eficácia. Essas normas diretivas na doutrina italiana são: a) diretivas, ou programáticas dirigidas ao legislador sem excluírem a possibilidade de existirem leis editadas em desacordo com elas; b) preceptivas e obrigatórias ou de aplicabilidade imediata, por modificarem ou ab-rogarem leis contrárias, anteriormente editadas; c) preceptivas, obrigatórias, mas sem aplicabilidade imediata, que invalidam novas leis violadoras, embora não alcancem a eficácia das leis anteriores enquanto a sua aplicação estiver suspensa13
13. DINIZ, Maria Helena. Normas constitucionais e seus efeitos. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 1997. p. 102-103.
.
Dentro dessa classificação, o intérprete, se quiser, pode verificar em qual situação acomodará a regra outras controvérsias decorrentes do contrato de trabalho (ou de emprego) na forma da lei. Como o legislador não deixa dúvida em qual situação e a quem cabe a aplicação das normas preceptivas, de caráter obrigatório e impositivo, no caso em apreço entende-se como dirigidas aos juízes trabalhistas - Justiça do Trabalho. O mesmo ocorre com as preceptivas obrigatórias, ou de aplicabilidade imediata. A norma constitucional do art. 114, inciso IX , modifica ou ab-roga leis contrárias, anteriormente editadas a 1988, ainda que sua aplicação esteja suspensa e se sua redação for incompatível com a Carta Magna.
Helena Diniz cita, também, o entendimento de Vezio Crisafulli, que classifica as normas constitucionais: a) de eficácia plena, com imediata aplicação; e b) normas de eficácia limitada, que podem ser de legislação e programática 14
14. Idem, p. 104.
. A regra jurídica constitucional do art. 114, inciso IX , enquadra-se na primeira classificação, pelo fato de o legislador, na sua elaboração, visar a essa finalidade - eficácia plena, com imediata aplicação.
José Afonso da Silva, no tópico características básicas das normas constitucionais de eficácia plena, afirma não ser fácil distinguir as normas constitucionais de eficácia plena daquelas de eficácia contida ou limitada. Acrescenta ser um problema tormentoso a interpretação das normas constitucionais, e a sua solução se reveste de grande importância prática. Cita, como exemplo, uma decisão da Corte de Cassação italiana, que toma como critério de distinção o exame de caso por caso para se saber de que eficácia as normas constitucionais são dotadas, a quem se dirigem e, portanto, que efeitos podem e devem produzir. Na aplicação da regra outras controvérsias decorrentes da relação de trabalho (ou de emprego), quando a questão envolver trabalho extenuante e descumprimento das leis trabalhistas, a norma incidente é a de eficácia plena, em vista de ser a intenção do legislador que o Judiciário trabalhista encontre para a situação uma resposta rápida, prática e pragmática.
Assim, para José Afonso da Silva, as normas de eficácia plena incidem diretamente sobre os interesses a que o constituinte quis dar expressão normativa15
15. SILVA, José Afonso da. Aplicabilidade das normas constitucionais. 6. ed. São Paulo: Malheiros, 2001. p. 88-101.
. Acresce que são de aplicabilidade imediata, porque dotadas de todos os meios e elementos necessários à sua executoriedade16
16. Idem, p. 101-102.
, entendimento que se adéqua perfeitamente à regra do art. 114, inciso IX, da Carta Magna .
Na situação anteriormente citada, não têm aplicação as normas de eficácia contida ou as de eficácia limitada. Todavia, não é demais verificar em quais situações ocorre sua aplicabilidade. Para entendê-las, mais uma vez recorre-se aos pontos de vista de José Afonso da Silva, que pontua as características, enumeração e indica quais as peculiaridades. No discorrer sobre normas de eficácia contida e normas de eficácia limitada, será clarificada sua verdadeira função legislativa, se é possível ou não preencherem a descrição da norma outras controvérsias decorrentes da relação de trabalho na forma da lei, ou se a referida norma é própria da de eficácia plena.
4 - NORMAS DE EFICÁCIA CONTIDA
Algumas normas de eficácia contida fazem referência a uma legislação futura, e contidas nelas estão várias normas programáticas ou normas de legislação, entretanto José Afonso da Silva opõe-se a essa assertiva ao declarar haver “equívoco manifesto, porquanto o fato de remeterem a uma legislação futura não autoriza equipará-las a outras que exigem uma normatividade ulterior integrativa de sua eficácia”17
17. Idem, p. 103.
. Aponta 5 (cinco) peculiaridades que as caracterizam:
1 - Em regra, necessitam da intervenção do legislador ordinário, com indicação de uma legislação futura de forma expressa, que visa restringir-lhes a plenitude da eficácia, com o propósito de regulamentar os direitos subjetivos que delas decorrem para os cidadãos, indivíduos ou grupos;
2 - Produz eficácia plena enquanto não for expedida pelo legislador ordinário a normação restritiva.
3 - Sua aplicabilidade é direta e imediata, por conterem normatividade suficiente aos interesses vinculados à matéria de que tratam;
4 - Algumas dessas normas já contêm um conceito ético juridicizado (bons costumes, ordem pública, etc.), como valor societário ou político a preservar, que implica a limitação de sua eficácia;
5 - Sua eficácia pode, ainda, ser afastada pela incidência de outras normas constitucionais, se ocorrerem certos pressupostos de fato (estado de sítio).18
18. Idem, p. 103-104.
5 - NORMAS DE EFICÁCIA LIMITADA
As normas de eficácia limitada estão contidas nas normas constitucionais de princípios e dependem de outras providências para que possam produzir efeitos essenciais objetivados pelo legislador constituinte. As normas constitucionais deprincípios podem ser: normas constitucionais de princípios gerais, normas princípios gerais e princípios gerais de direito constitucional.
As normas constitucionais de princípios gerais (Crisafulli) ou normas fundamentais (José Afonso da Silva) são as normas das quais derivam logicamente as normas particulares reguladoras das relações e situações específicas da vida social;normas princípios gerais são, por exemplo, as contidas no art. 5º, princípio da isonomia (inciso I), da legalidade (inciso II), etc. São princípios gerais de direito constitucional: a) o da supremacia da constituição; b) o do federalismo que envolve a autonomia dos Estados; c) o da autonomia municipal; d) o do controle jurisdicional da constitucionalidade das leis; e) o da proteção da autonomia individual em face ao poder, decorrente da declaração dos direitos individuais e das garantias constitucionais; f) o da proteção social do trabalhador; g) o da proteção da família, do ensino e da cultura, embora ainda com características programáticas; h) o da independência da magistratura; i) o da representação partidária, etc.19
19. Idem, p. 121.
.
6 - A INTERPRETAÇÃO DA NORMA “OUTRAS CONTROVÉRSIAS DECORRENTES DA RELAÇÃO DETRABALHO
O descumprimento dos direitos fundamentais e das leis trabalhistas em si, bem como a inexistência de uma ação prescritiva pelo Estado, alimenta em alguns empregadores a permissão de não desistirem de impor ao obreiro trabalhodegradante ou em condições degradantes ou extenuantes.
O juiz do trabalho contemporâneo não mais se limita a decidir, nas ações trabalhistas, apenas aviso prévio, férias, 13º salário e FGTS, mas outras pretensões, a exemplo das contidas em outras controvérsias decorrentes de relação detrabalho (ou de emprego). A Constituição Federal de 1988 , por meio da Emenda Constitucional nº 45 , atribui à Justiça doTrabalho caminhos mais amplos para conhecer outras questões judiciais que envolvem empregados e empregador, e, neste rol, está o de julgá-lo criminalmente, contanto que o delito esteja vinculado ao contrato de emprego, exceto o crime de homicídio, tentativa de homicídio e lesões corporais e (os de interesse da União). Os juízes trabalhistas, com fundamento na Carta Magna (art. 114, inciso IX) , têm competência para posicionarem-se de forma ostensiva nas situações anteriormente expostas para que não se torne contumaz a ação de alguns empregadores na prática de crimes contra o operário e permaneçam impunes. O uso do álibi pelo juiz trabalhista de incompetência em razão da matéria, diante dessa nova realidade, tem possibilidade de ser desprezado. A solução está no contexto de outras controvérsias decorrentes da relação de trabalho (ou de emprego) na forma da lei. A competência do Judiciário trabalhista para decidir sobre os crimes do empregador decorrentes da relação de trabalho, a partir de 1988, é válida, mas só se faz eficaz e efetiva se o juiz procurar empregar a Lei Maior mediante o uso de toda sua força normativa.
A colocação do termo na forma da lei no final do inciso IX do art. 114 da Lei Maior implanta um erro técnico-jurídico e terminológico, que aflora com a Emenda Constitucional nº 45 , em substituição à redação original que era na forma da lei, outras controvérsias, e também albergava a competência da Justiça, porém condicionada à existência de uma lei já vigente. O legislador constituinte, na elaboração da redação original do art. 114 da Constituição Federal , deixa-se, com aEmenda Constitucional nº 45 , influenciar por pessoas que visam a prejudicar os trabalhadores, e insere, na Carta Magna, a expressão na forma da lei, depois da norma outras controvérsias, cuja emenda sai pior que o soneto. A redação é duvidosa pelo fato de envolver competência absoluta, atribuída ao órgão do Poder Judiciário trabalhista e não ser possível seu modus operandi em forma de norma programática, mas de norma (lei) constitucional de eficácia plena. A insegurança e a incerteza jurídicas do legislador constituinte fazem-se notar na indisposição ou na falta de conhecimento técnico-jurídico para editar a referida lei, ou por ter visto a sua impossibilidade legislativa. A expressão na forma da lei dá a impressão de haver incompletude linguística no art. 114, inciso IX, da Lei Maior . O suposto vazio na norma, como aparenta existir, não há. A norma é completa e a eficácia é plena, em face de sua natureza - norma constitucional atribuidora de competência. Uma norma constitucional atribuidora de competência ao Judiciário, se não for de eficácia plena, as questões jurídicas não alcançarão decisões plausíveis, porque o juiz se defrontará com uma norma de competência incerta, inaplicável ao caso e as partes não alcançarão a segurança jurídica com a sentença prolatada pelo juiz.
Antes da Emenda Constitucional nº 45/2004 , o termo na forma da lei vinha anterior à norma outras controvérsias; hoje ela vem depois. O que muda nessa transferência de posição na norma? Na redação original, o legislador constituinte comete seu primeiro erro técnico-jurídico. A expressão na forma da lei, anteposta a outras controvérsias, tem o significadode acordo com a lei, conforme a lei, pois dá a entender que a lei já existe antes mesmo da Constituição. Com a Emenda Constitucional nº 45 , o equívoco do legislador, o segundo, é ainda mais grave, porque ao pospor a expressão na forma da lei à norma outras controvérsias, quer subtender que, posteriormente, editaria uma lei complementar, o que é incabível na situação por se tratar de regra de competência a um órgão do Poder Judiciário - Justiça do Trabalho - porquanto não é suscetível de atribuição ou reconhecimento por meio de lei complementar. Esclarece, ainda, que a expressão na forma da lei, para os casos em que a Constituição permite a edição de lei futura, necessariamente, o legislado tem o dever de especificar na norma constitucional programática a natureza ou o tipo de lei que será posta no mundo jurídico como possível reguladora de comportamentos dos indivíduos. Assim, a expressão na forma da lei, depois da norma outras controvérsias decorrentes da relação de trabalho, contida no inciso IX do art. 114 da Carta Magna , representa um vazio inútil.
A regra do art. 114, inciso IX, da Carta Magna , tem, na linguagem semântica, sua origem no pensamento iluminista francês do século XVII e na Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789 - direitos individuais - denominados de liberdades públicas, que constituem a afirmação jurídica da personalidade humana 20
20. BARROSO, Luiz Roberto. O direito constitucional e a efetividade de suas normas. 8. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2006. p. 96.
.
O Poder Judiciário trabalhista, ao decidir sobre questões contidas em outras controvérsias decorrentes da relação detrabalho (ou de emprego), protege valores relativos à vida, à liberdade, à segurança e à propriedade, em face das limitações ao poder político mediante o traço diretivo à esfera de proteção jurídica do indivíduo em face do Estado 21
21. Idem, p. 97.
.
Barroso, ao discorrer sobre a aplicabilidade direta das normas constitucionais, chama a atenção para o campo mais rigidamente delimitado, de caráter essencialmente técnico, ligado à interpretação e à aplicação do Direito, e diz como se deve proceder:
Cuidar de procurar apreender o verdadeiro alcance das situações jurídicas instituídas pela Constituição, geradoras de pretensões dedutíveis perante o Poder Judiciário, como órgão apto a proporcionar a realização concreta dos comandos normativos, inclusive ante a eventual omissão dos órgãos do Poder Público.22
22. Idem, p. 138.
Em continuidade ao seu argumento, assinala:
Não é outra a motivação desse estudo, com o qual se busca inverter, em resultados efetivos, as proposições eternamente inócuas da Lei Maior, reavivando-se na prática dos Poderes Públicos, notadamente pela intervenção de Juízes e Tribunais. Cabe distinguir, para esse fim, duas ordens de situações diversas: a) as que devem ser prontamente exigíveis pela aplicação direta do Texto Constitucional; b) as que prescindem de legislação infraconstitucional integradora para deflagração da plenitude de seus efeitos.23
23. Idem, p. 139.
Quando há desrespeito às leis sociais trabalhistas, causadoras de lesões de ordem econômica e social ao trabalhador, bem como exposição do obreiro a trabalho degradante ou em condições degradantes, caracteriza-se, nas duas situações de fato, a necessidade de o Poder Judiciário verificar o verdadeiro alcance das referidas situações para, dentro de sua competência constitucional, concretizar os comandos normativos adequados. Nessas situações não lhe é permitido ficar omisso. O fato, quando chega ao seu conhecimento, impõe ao Judiciário o dever de agir. Se a situação jurídica não está especificada de forma clara na norma, mas descrita como de sua competência, cabe-lhe conhecer, analisar, interpretar o caso e, por fim, aplicar o direito incidente. Aí, pouco importa se a regra é de Direito Civil ou de Direito Penal. Interessa ao juiz trabalhista e lhe compete verificar se é decorrente da relação de trabalho ou de emprego, pois só assim terá a certeza de que a situação se insere na norma outras controvérsias decorrentes da relação de trabalho (ou de emprego), que comporta várias situações jurídicas e várias caracterizações jurídicas.
O juiz do trabalho, na realização desses atos processuais constitucionais, está a resguardar a segurança jurídica da parte trabalhadora, porque não vislumbra na expressão outras controvérsias... a possibilidade da existência de indeterminação de conceito, ou de efetividade, por meio de interpretação imprópria e para o magistrado não incidir no tipo descrito por Montesquieu de ser mero instrumento do que diz a lei. Cabe, então, ao juiz trabalhista verificar cuidadosamente que intenção o legislado constituinte pretende que dê à regra: se restritiva ou extensiva. Torna-se prudente verificar se o legislador constituinte, na elaboração da norma supracitada, quer que o intérprete atue com mais amplitude ou menos que o seu pensamento. A interpretação extensiva consiste em aplicar a lei a um fato que não está claramente compreendido em seu teor literário, mas em seu espírito ou vontade. A interpretação se há de manter sempre dentro dos limites do sentido literal possível do preceito, do significado próprio da norma24
24. GARCÍA, Manuel Calvo. Interpretación y argumentación jurídica. Zaragoza/Espanha: Paz, 2000. p. 110.
. A segurança jurídica está na efetividade da norma, que traz a certeza do que deve ser feito, como aplicá-la, quando aplicar e em quais situações tem cabimento. A norma outras controvérsias decorrentes da relação de trabalho (ou de emprego), por si só, já é o bastante. É completa. O seu conteúdo restringe horizontes judiciários e apenas direciona sua aplicação em casos para aqueles que estão vinculados a um contrato de trabalho e disso se extrai ser competente a Justiça do Trabalho.
A competência da Justiça do Trabalho para operar nesses casos se sobressai, também, por conta de estar mais enfronhada e aproximada dos problemas sociais que atingem e afligem os trabalhadores na relação entre trabalho e emprego. Dentro dessa competência, cabe ao juiz do trabalho valer-se de seus conhecimentos práticos, todavia, sempre atado à hermenêutica jurídica constitucional, e se posicionar contra os privilégios, por serem estes daninhos aos preceitos igualdade/liberdade e constituintes de estratificação social.
7 - A HERMENÊUTICA JURÍDICA CONSTITUCIONAL FRENTE AOS PRIVILÉGIOS
Para discorrer sobre a adoção da hermenêutica jurídica constitucional, imperioso torna-se antes adentrar na discussão dos conceitos jurídicos fundamentais, aplicados na argumentação judicial. As situações jurídicas aqui outras não são senão as relativas a trabalho degradante e a descumprimento das leis trabalhistas, inseridas no contexto de crime contra a organização do trabalho, levadas ao conhecimento do juiz do trabalho como outras controvérsias decorrentes da relação de trabalho, e se o empregador infringente recebe alguma penalidade pela prática do crime.
Assim, a primeira indagação a se fazer diz respeito a privilégios do empregador na lei em contraposição aos não direitos dos trabalhadores, em vista de o empregador que submete o obreiro a trabalho degradante ou a condições degradantes e/ou desrespeita as leis sociais trabalhistas, equivocadamente entende que pode tudo, pelo fato de ser detentor do capital, representante do poder econômico, traduzido como protótipo do capitalismo escravizante. Julga-se acima da lei, coberto deprivilégios em detrimento dos direitos dos trabalhadores.
Ser o dono do capital, não resta dúvida, constitui um privilégio econômico provisório ou temporário do empregador frente aos trabalhadores; contudo, esse privilégio não lhe dá o direito de subjugar os obreiros, reduzi-los à condição análoga à de escravo ou não respeitar seus direitos trabalhistas. O trabalhador é pessoa humana, assim como é o empregador, destarte, nessa condição, aquele deve ser visto pelo juiz no momento de julgar a ação e de interpretar a norma
outras controvérsias decorrentes da relação de trabalho (ou de emprego), em razão de o juiz dever procurar, compreender, investigar, renovar o significado e o alcance dos enunciados linguísticos que formam o Texto Constitucional. É um trabalho de mediação que torna possível concretizar, realizar e aplicar os preceitos constitucionais.25
25. CARVALHO, Haydê Porto de. Hermenêutica constitucional. Florianópolis: Obra Jurídica, 1997. p. 53.

A Constituição representa o ordenamento jurídico de conduta para todos, indistintamente, inclusive para o próprio Estado, dispensa a quem quer que seja qualquer tipo de privilégio, porquanto, isso ocorreu no passado, no período estamental da Idade Média, em proveito das elites da nobreza. Nos dias atuais, em que reina o Estado Democrático de Direito, pensar dessa forma significa embrenhar-se em um comportamento ultraconservador, bastante ultrapassado, daí, contemporaneamente, haver a necessidade de punir aos transgressores da lei, a fim de despertá-los para a nova realidade. O juiz, como intérprete da norma constitucional, é obrigado a obedecer ao seu comando ou postulados ditados pela Carta Magna, uma vez que a interpretação constitucional tem uma finalidade, como bem elucida Salomão Leite: “que é o de promover o programa social, preservar a estabilidade das instituições político- jurídicas e garantir os direitos fundamentais”26
26. LEITE, Salomão George. Interpretação constitucional e tópica jurídica. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2002. p. 51.
.
Assim, na Constituição Federal de 1988 , aparece o conceito de conteúdo essencial como limite que o julgador tem de observar em todo caso chegado ao seu conhecimento, para que prevaleça o exercício dos princípios e dos direitos fundamentais, nos quais estão as liberdades fundamentais como corolário de direitos fundamentais das pessoas de serem livres na escolha e forma de trabalho, bem como gozar dos direitos trabalhistas previstos na legislação obreira, na constitucional e nas leis esparsas, pois todas elas, sem exceção, são protetoras do trabalhador e contrárias ao trabalhodegradante como restrição às liberdades fundamentais. Ceifar do trabalhador esses direitos ou condicioná-lo a trabalhar de forma não condizente como determinam a legislação pátria e as leis de higiene e bons costumes, a concepção a atribuir outra não é senão a de que alguns empregadores ainda veem o empregado como objeto, submetem-no aos mais humilhantes tipos de trabalho, com restrição das liberdades fundamentais, porque têm a certeza de nunca serem punidos.
8 - O TRABALHO DEGRADANTE COMO RESTRIÇÃO DAS LIBERDADES FUNDAMENTAIS
Não faz muito tempo que a pessoa humana conquistou o espaço da liberdade. Até o início do Iluminismo, século XVI, na Europa, as liberdades do homem eram limitadas e, a partir do século XVII, com o fortalecimento da Era da Razão, começam a fluir na Filosofia e no Direito ideias mais firmes sobre liberdade, que tiveram maior reconhecimento com a concretização e a deflagração da Revolução Francesa, de 1789. Liberdade significa independência, não absoluta, mas relativa, por conta de que todos vivem na sociedade em completa interdependência, em vista de ser o mesmo que dependência mútua. Não obstante, na acepção política e social, é a capacidade que a pessoa tem de atuar na sociedade, de forma livre, sem pressão, porém regrada pela legislação vigente. Dentro do direito positivo - Direito Constitucional - em um Estado Democrático de Direito brota a noção de liberdades públicas e liberdade fundamental.
trabalho degradante encontra sua oposição nas liberdades públicas. Recentemente, o Professor Wilson Ramos Filho escreveu a Delinquência patronal, repressão e reparação, em que ensina ter a Lei nº 9.777, de 29.12.1998 , alterado a redação do art. 203, do Código Penal , com ampliação das penas da figura delituosa o “crime de frustração de direito assegurado pela legislação trabalhista que visa, por intermédio de tal medida, ampliar-lhe a eficácia”27
27. RAMOS FILHO, Wilson. Delinquência patronal, repressão e reparação. Disponível em: <htt://aulavirtual.Upo..Sevilla.2009>.
. Acrescenta “que a conduta tipificada como crime consiste em fraudar, ou seja, em privar o empregado de direitos fixados pela legislação trabalhista, sonegar-lhe prerrogativas chanceladas em lei”28
28. Idem.
.
Outra situação elucidada pelo Professor Ramos é com relação à ocorrência do fenômeno denominado de escravidão contemporânea, atribuído à ausência de fiscalização/repressão por parte de seus agentes (DRTs, Ministério Público doTrabalho, Justiça do Trabalho e outros), incumbidos constitucionalmente de velar pelas relações de trabalho dignas, no campo ou nas cidades29
29. Idem, p. 3.
. O Jurista em comento foi muito feliz nas suas considerações ao abordar outra questão de grande importância, relativa à atribuição de responsabilidade a quem realmente atua como responsável, ou seja, ao agente da ação criminosa, aquele que pratica o crime, o responsável pela neoescravidão, por frustrar direitos fixados pela legislação trabalhista. Também essa visão flui por duas vertentes: a primeira se inclina para a utilização de sujeito substitutivo para apresentá-lo como agente do crime de submissão alheia a regime de neoescravidão; e a segunda encontra explicação em algo muito concreto, na busca do lucro antijurídico, pela certeza da impunidade30
30. Idem, p. 4.
.
A partir de dezembro de 2003, esclarece Ramos Filho, a redução à condição análoga à de escravo fica restrita a quatro hipóteses: a) sujeição alheia a trabalhos forçados; b) restrição, por qualquer meio, da locomoção alheia; c) sujeição alheia às condições degradantes de trabalho; e d) sujeição alheia à jornada exaustiva31
31. Idem, p. 8.
. Verificadas qualquer uma das quatro hipóteses, ainda que separadamente, estar-se-á diante de um crime tipificado como tal pela legislação penal brasileira, que enseja a repressão penal e a reparabilidade civil no âmbito da Justiça do TrabalhoAs hipóteses anteriormente citadas acolmatam-se na regra outras controvérsias decorrentes da relação de trabalho (ou de emprego) por conta de terem surgido no reino da relação empregatícia. Há critérios diferenciadores entre os conceitoscondições degradantes de trabalho trabalho executado em condições degradantes. As condições degradantes de trabalhosão absolutamente incompatíveis com a ordem jurídica (Direito Internacional do Trabalho e a legislação interna trabalhista e penal brasileira), o trabalho degradante, em si, seria reconhecido pelo Direito do Trabalho. O trabalho em condições degradantes se definiria a partir da relação entre o trabalhador e os meios de prestação do trabalho; o trabalhodegradante pelo tipo de atividade realizada. Enfim, nas condições degradantes de trabalho, degradante seriam ascondições; no trabalho degradante, o próprio trabalho 32
32. Idem, p. 9.
.
Nas duas situações jurídicas, está tipificado o crime de autoria do empregador, cujo delito requer aplicação de penalidade pelo juiz do trabalho, em face de ambos os delitos estarem contidos na regra constitucional do art. 114, inciso IX, da Carta Magna .
Ramos Filho argumenta que o Direito do Trabalho reconhece a legalidade do trabalho degradante e promove sua legalização33
33. Idem, p. 10.
. Como, então, ocorre essa legalização? A Justiça do Trabalho determina a compensação financeira aos riscos de saúde do trabalhador, mediante sua remuneração com adicionais de insalubridade ou de periculosidade, ou de horas extras, etc.
O empregador que comete o crime contra o obreiro, e ao ser levado à Justiça do Trabalho, não paga integralmente os direitos trabalhistas lesados ao empregado. Apresenta-se predisposto e disposto a fazer uma conciliação em juízo por conta do lançamento da proposta conciliatória obrigatória, determinada por lei. Uma vez conciliados os direitos já antes lesados, o obreiro torna-se duas vezes vítima no seu patrimônio, e o pior é que alguns juízes persuadem o operário a aceitar a conciliação, sob o argumento de ser boa e razoável. O trabalhador, necessitado e sem o aparato do Estado-juiz para receber integralmente suas verbas rescisórias, aceita a ínfima quantia. Nessa circunstância, ocorrem dois crimes contra o trabalhador: o primeiro, o de trabalho extenuante com baixo salário; e o segundo, no momento da conciliação. Isso ocorrido, o Estado também é lesado, porquanto recebe, a título de contribuição previdenciária, valor inferior ao devido originalmente. A União pode, ainda, sofrer uma lesão maior, se houver discriminação pelo juiz sobre as verbas de natureza indenizatórias.
Diante do quadro anteriormente expendido, recorre-se, necessariamente, aos fortes argumentos de Ramos Filho:
Do raciocínio acima, conclui-se que, no direito brasileiro, trabalho degradante não é crime, desde que o empregador pague os efeitos patrimoniais previstos na legislação trabalhista, pois, se há pagamento o trabalho degradante será legitimado pela legislação trabalhista; o que é crime é submeter outrem a trabalho degradante sem o pagamento dos efeitos patrimoniais respectivos (adicionais). Assim, diante de uma situação em que o crime constitui o descumprimento da legislação trabalhista e o pagamento dos adicionais devidos os excludentes da culpabilidade não se caracterizam o crime. O trabalho, dessa forma, continua a ser prestado de forma degradante, mas sem configurar crime, porque cumprida a legislação trabalhista. E se não houver o pagamento? Aí haverá dois crimes: o do art. 149 do Código Penal(submeter trabalhador a condições degradantes de trabalho) e o do art. 203 do mesmo Código (frustrar direito assegurado pela legislação trabalhista).34
34. Idem, p. 11.
Em tais situações é que se impõe o dever de o juiz do trabalho interpretar a regra do art. 114, inciso IX, da Constituição Federal , conjugar com o princípio fundamental do art. 1º, incisos III e IV , relativo à dignidade humana da pessoa do trabalhador, e realçar os valores sociais do trabalho. A Carta Magna distingue responsabilidade criminal de responsabilidade civil (incluída também a responsabilidade trabalhista). A responsabilidade do empregador pelo pagamento dos efeitos patrimoniais previstos na legislação trabalhista não lhe isenta ou o torna imune da responsabilidade criminal. Se há previsão de responsabilizar o empregador pelos dois atos-fatos-ilícitos, ao juiz trabalhista compete fazer valer a lei, principalmente a constitucional.
CONCLUSÃO
A Constituição Federal é a bússola de todo e qualquer juiz brasileiro. Nela, estão, hoje, todos os direitos na forma de constitucionalizados. Assim se apresentam os direitos civis, os direitos trabalhistas, o direito penal e outros. Para o juiz, constitui um dever-ser procurar dentro da Lei Maior a adequação do caso ou a situação jurídica chegar ao seu conhecimento. Analisá-lo, interpretá-lo e aplicar a norma jurídica tem o sentido de estar o juiz a decidir em conformidade com a Constituição Federal, porque somente nela é que encontrarão fundamentos jurídicos palpáveis para a solução da situação, que impõe uma decisão jurídica presumivelmente justa.
As situações jurídicas relatadas no corpo do trabalho estão apensas à norma outras controvérsias decorrentes da relação de trabalho (ou de emprego), que no presente discurso entende como norma de eficácia plena, porque assim prevê o legislador constituinte, que não deixa espaço para elaboração de lei futura com o objetivo de sua aplicabilidade. A própria Constituição, ao reconhecer a competência da Justiça Federal para processar e julgar os crimes contra a organização dotrabalho, deixa claro que tal competência tem sua efetividade quando apenas houver interesse da União e só. O art. 109, inciso VI, da Constituição Federal não estende à Justiça Federal processar e julgar os crimes cometidos pelo empregador contra o empregado dentro da ordem crimes contra a organização do trabalho. O legislador constituinte deixa claro e estabelecido que, nos crimes decorrentes da relação de trabalho (ou de emprego) contra o trabalhador, a competência é da Justiça do Trabalho.
O juiz do trabalho tem na Constituição Federal espaço para agir como competente nos casos incidentes na norma do art. 114, inciso IX, da Carta Magna . Recusar-se a atuar dessa forma, sob a alegação de incompetência absoluta, é fazer da regra outras controvérsias decorrentes da relação de trabalho (ou de emprego), letra morta ou transformar essa parte da Constituição em simples pedaço de papel, como bem assinala Ferdinand Lassalle. A recusa pelo juiz de processar e julgar a situação, transforma-se em álibi que só serve para incentivar alguns empregadores na continuidade de crimes contra seus empregados ou prestadores de serviços. O direito material somente tem sentido e encontra concretização se antes tiver sua base fortalecida na fonte formal. O direito positivo formal vem ao mundo jurídico com a finalidade de ser materializado nas situações jurídicas surgidas, levadas ao Judiciário pelo interessado e, então, aí se concretizarem, formarem os verdadeiros direitos por meio das decisões judiciais racionais e coerentes com a Constituição Federal, porque só o juiz, como primeiro intérprete da lei, está legitimado a despojá-la de sua condição simbólica, dar-lhe real e verdadeira efetividade mediante sua inclusão no mundo da concretização.
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Autor: Manoel Hermes De Lima Título: OS CRIMES CONTRA O TRABALHADOR NO EMPREGO E A INEXISTÊNCIA DE PUNIBILIDADE. Disponível em:http://online.sintese.com.